Um cliente entra pelo espaço a dentro. Diz que precisa de uma avaliação para motivos profissionais. O psicólogo passa 3, 4 sessões a entrevistar e passar testes psicológicos. Na última sessão, o psicólogo entrega um relatório com as suas conclusões.
O cliente passa logo para a última página, para o último parágrafo, para aquele nome pomposo começado por "Perturbação"... Tudo aquilo que o psicólogo diz a seguir parece nem sequer entrar, na cabeça das pessoas. Mas será que vale mesmo a pena a atitude?
Uma das muitas competências de um Psicólogo é a realização do processo de Avaliação Psicológica, o único técnico que tem competências para o fazer. Se quiser saber um pouco mais sobre o processo, convido-o a ler as informações, no site da Mindfull. Aquela que é a característica mais controversa de um relatório de avaliação psicológica é os seus resultados serem consagrados numa categoria de diagnóstico. Mas porque é que isso surge?
Para obtermos as respostas, temos de retomar algumas centenas de anos atrás, no surgimento da Psiquiatria. A Psiquiatria foi a primeira especialidade a lidar com a saúde mental. Sendo uma especialidade medica, a Psiquiatria agia de acordo com o modelo médico, ou seja, a pessoa era entrevistada em forma de perguntas directas, era realizado um diagnóstico e era dada a adequada prescrição. Com o desenvolvimento da Psiquiatria e das teorias que a compunham, começou a existir a necessidade de criar uma categorizarão organizada das perturbações que fossem surgindo. A resposta foi o conhecido DSM.
Conhecido com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Perturbações Mentais, o DSM foi a resposta oficial da Psiquiatria, organizando as diferentes perturbações em categorias e eixos de avaliação. Desde o seu lançamento, o DSM conta já a sua quinta edição, não contanto com edições revistas (como a 3ª e 4ª). A controvérsia começa pelo facto deste manual ser organizado pela Associação Psiquiátrica Americana, reunindo a opinião dos seus membros em relação aos casos que mais surgem, fazendo com o suporte empírico seja muito reduzido. Isso fez com que muitas posições fossem tomadas como por exemplo, na 3ª edição do DSM, homossexualidade era considerada como uma perturbação da esfera sexual. Com o aumento de abertura de escolha de orientação secual, os autores recuaram na sua decisão e a consideração da homossexualidade foi retirada no DSM-IV, sem apresentação de uma justificação cientifica. Para além do DSM, a OMS (Organização Mundial de Saúde) possui uma parte reservada à saúde mental no seu manual médico oficial, o ICD ou Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde. Com uma organização que difere do DSM, a vantagem do ICD é ser utilizado internacionalmente, o que facilita na comunicação entre técnicos e países, através de uma codificação especifica. Mas afinal, o que é que isso tem haver com a Psicologia?
A dada altura da sua história, para aumentar a sua credibilidade enquanto ciência, a Psicologia considerou que se deveria aproximar da Psiquiatria. A forma como escolheu foi tentar assimilar o método clínico e integrar a Psicopatologia, a área que estuda os estados psíquicos associados ao sofrimento mental, com informações vindas da Psicologia, Psiquiatra, Neurociências, Psicanálise, etc. É a Psicopatologia que nos permite criar programas específicos de prevenção e intervenção na saúde mental, contribuindo para o bem-estar mental e físico. Desta forma, a Psicologia começou a integrar também as classificações de perturbações mentais.
Com o passar do tempo, certas áreas da sociedade começaram a exigir, legalmente, a colocação de um termo técnico resultante da avaliação. Temos, por exemplo, o caso da Educação Especial, empregos que exigem condutores profissionais, processos de imputabilidade legal, etc. Assim sendo, a Psicologia teve que utilizar como recursos manuais, como o DSM. Infelizmente, o precedente do "rótulo" foi criado e o seu estigma foi implantado na sociedade. Assim sendo, estaremos no bom caminho?
Não sei se estaremos. Apesar de diagnósticos poderem ser orientadores, como no caso da Educação Especial (de modo a poder-se orientar as adequações necessárias), fazem com as pessoas fiquem demasiado fixos, como se fosse uma sentença a que a pessoa não se pode livrar. Em parte, a culpa poderá ser dos técnicos porque impulsionam esse movimento, sem educar as pessoas para a real importância da intervenção. Ficarmos presos ao diagnóstico implica que não nos esforcemos na intervenção e, ao mesmo tempo, desculpabiliza o comportamento. Toda a minha vida vou ser infeliz por estar com uma depressão.
Naquilo que diz respeito à Psicologia e Psicoterapia, o importante é a parte da intervenção e não no diagnóstico. A nossa intenção é, como acima referido, potenciar o bem-estar psicológico e físico.